Homenageados criticaram patrocínio da petroleira e atriz jogou óleo queimado no palco, simulando petróleo
Cecília Toledo
da revista Marxismo Vivo
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Fotos: Blog Coletivo Dolores e Marcos Issa/Argosfoto
Ao receberem o prêmio, atriz Nica Maria derrama óleo no ator Tita Reis, e exibe ao público.
• Merece todo o nosso apoio a atitude corajosa do Coletivo Dolores Boca Aberta Mecatrônica de Artes, um dos grupos teatrais de São Paulo, durante a 23ª. cerimônia de entrega do Prêmio Shell de Teatro. Na hora de receber o troféu, dois atores do grupo fizeram uma pequena encenação em protesto contra a empresa. A atriz Nica Maria jogou óleo queimado, simulando petróleo, sobre a cabeça do ator Tita Reis, que em seu discurso ironizou o patrocínio da Shell. “Nosso coração artista palpita com mais força do que qualquer golpe de estado patrocinado por empresas petroleiras”, disse o ator. Foi uma enorme surpresa para o público e para os patrocinadores, que nunca esperavam tamanha ousadia por parte de um grupo selecionado para receber o prêmio.
Viva Dolores! Teatro popular contra a privatização da cultura
O Coletivo Dolores foi premiado com o espetáculo A Saga do Menino Diamante, no dia 15 de março, na categoria especial do 23º Prêmio Shell de Teatro, tradicional premiação que acontece em São Paulo e no Rio de Janeiro. Apesar de aplaudida por parte do público, a cena espantou muitos presentes no local, entre eles, conhecidos nomes do meio artístico paulista. A atriz Beth Goulart, que apresentava a cerimônia, indignou-se com a atitude do Coletivo. “Receberam um carinho e deram um tapa”, disse. Apesar do protesto, o grupo recebeu o prêmio de 8 mil reais, “uma parte irrisória das enormes riquezas que a Shell já extraiu durante todos esses anos de nossos trabalhadores”.
O Coletivo Dolores foi premiado com o espetáculo A Saga do Menino Diamante, no dia 15 de março, na categoria especial do 23º Prêmio Shell de Teatro, tradicional premiação que acontece em São Paulo e no Rio de Janeiro. Apesar de aplaudida por parte do público, a cena espantou muitos presentes no local, entre eles, conhecidos nomes do meio artístico paulista. A atriz Beth Goulart, que apresentava a cerimônia, indignou-se com a atitude do Coletivo. “Receberam um carinho e deram um tapa”, disse. Apesar do protesto, o grupo recebeu o prêmio de 8 mil reais, “uma parte irrisória das enormes riquezas que a Shell já extraiu durante todos esses anos de nossos trabalhadores”.
O ator Luciano Carvalho, integrante do Coletivo, explicou que a oposição do Dolores não é somente ao fato de ser a Shell a financiadora do prêmio, mas à lógica onde se insere a produção artística brasileira. “As grandes empresas tornam-se reis dos estados absolutistas de hoje e dizem o que é bom e o que é ruim. É como se fosse um polvo com todos os seus tentáculos infindáveis que estão, inclusive, na cultura, porque também é espaço de construção de ideologia”. Essa postura é apoiada pela maioria dos grupos de teatro popular e comunitário de São Paulo, que vivem à míngua enquanto o teatro se elitiza. “Esse tipo de prêmio expõe a maneira como essa área cultural e artística do nosso país está privatizada”, alerta Jorge Peloso, do grupo Impulso Coletivo.
A atitude do Coletivo Dolores contra a Shell recebeu o apoio e a solidariedade de inúmeros grupos teatrais, numa demonstração de coragem e conscientização para lutar contra a privatização da arte e da cultura. Essa atitude tem dois significados políticos da maior importância. Em primeiro lugar, é um repúdio à própria Shell, empresa multinacional que há mais de 30 anos está instalada no Brasil, explorando as nossas riquezas, extraindo enorme mais-valia dos trabalhadores petroleiros, reprimindo as greves e demitindo funcionários, além de envenenar o solo brasileiro, como ocorreu recentemente em uma de suas refinarias.
Em segundo lugar, a atitude do Dolores expõe de forma contundente o quanto a cultura brasileira está privatizada, está nas mãos das empresas privadas que definem os rumos de nossa cultura sem que o governo Dilma faça nada para mudar essa situação. Pelo contrário, o novo plano de política cultural da ministra Ana de Holanda é totalmente assentado na parceria público-privada e não prevê a extinção da renúncia fiscal, mecanismo sórdido pelo qual os empresários “financiam” as artes com dinheiro público, porque não pagam impostos.
Abaixo publicamos o texto lido pelo grupo no momento da premiação e a nota divulgada pelo Coletivo Dolores:
"Para nós do coletivo artístico Dolores é uma honra participar deste evento e ainda ser agraciado com uma premiação.
Nosso corpo de artista explode numa proporção maior do que qualquer bomba jogada em crianças iraquianas.
Nosso coração artista palpita com mais força do que qualquer golpe de estado patrocinado por empresas petroleiras.
Nossa alegria é tão nossa que nenhum cartel será capaz de monopolizar.
É muito bom saber que a arte, a poesia e a beleza são patrocinadas por empresas tão bacanas, ecológicas e pacíficas.
Obrigado gente, por essa oportunidade de falar com vocês.
Nosso corpo de artista explode numa proporção maior do que qualquer bomba jogada em crianças iraquianas.
Nosso coração artista palpita com mais força do que qualquer golpe de estado patrocinado por empresas petroleiras.
Nossa alegria é tão nossa que nenhum cartel será capaz de monopolizar.
É muito bom saber que a arte, a poesia e a beleza são patrocinadas por empresas tão bacanas, ecológicas e pacíficas.
Obrigado gente, por essa oportunidade de falar com vocês.
Até o próximo bombardeio...
...quer dizer, até a próxima premiação!!!"
...quer dizer, até a próxima premiação!!!"
Nota pública do Coletivo Dolores sobre ato na 23ª edição do Prêmio Shell
É evidente para quem acompanha a trajetória do Coletivo Dolores que somos avessos às premiações como instrumento de eleição dos "melhores". Este mecanismo, além de naturalizar hierarquias e competições, faz com que determinados grupos detenham o poder de decidir o que é ou não é arte.
Atualmente, em nosso país, o fazer cultural é dominado por grandes empresas privadas que, baseadas em critérios falsamente neutros e na força do dinheiro, ditam qual filme devemos ver, qual música devemos escutar, qual peça teatral devemos assistir. O financiamento privado exclui e, até mesmo, inviabiliza o fazer artístico que não se enquadre em seus critérios, sejam eles estéticos ou mercadológicos.
A liberdade de expressão, tão amplamente defendida, é restringida quando meia dúzia de financiadores domina a produção cultural. Muitas vezes, esses financiadores privados se utilizam de dinheiro público por meio de isenções fiscais e ainda se beneficiam do marketing propiciado. Esta engrenagem é viabilizada pela Lei Rouanet, à qual nós e inúmeros outros coletivos artísticos frontalmente nos opomos.
Também não deixa de ser tristemente irônico que uma das premiações mais conceituadas no meio artístico seja patrocinada por uma empresa que participa ativamente da lógica de produção de ditaduras perenes, guerras e golpes de Estado. Assim sendo, publicamente nos irmanamos a todas as lutas de emancipação de povos que possuem a riqueza do petróleo, mas que não podem usufruir deste recurso devido à ingerência de potências militares em seu território e à presença de empresas petrolíferas nacionais e transnacionais que usurpam essa riqueza.
Aproveitamos para declarar publicamente que aceitamos o prêmio. Em nosso entendimento, esta é uma forma de restituição de uma ínfima parte do dinheiro expropriado da classe trabalhadora. Recebemos o que é nosso (enquanto classe, no sentido marxista) e debateremos um fim público para esta verba.
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