sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Cracatoa Simplesmente Sumiu

Como eu poderia amar você
Posted: 08 Aug 2008 07:08 AM CDT
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.(Ausência, Vinicius de Moraes)
Para Maísa
Quero amar você, que nem conheço, como quem acrescenta, na mera e improvável possibilidade de amar. Não como quem preenche. Não como a casca de alegria que pressiona o núcleo de tristeza que hora ou outra vai implodir toda a estrutura arquitetada.
Pretendo adicionar coisas por dentro e por fora. Não só felicidades: admita imediatamente ao olhar nos meus olhos - que já são de outras eras - o nosso eventual desamparo. Não surpreenda-se comigo ou com coisas que você mesma já sabe.
Amar pode doer e exige músculo, pode desgastar os nervos. Nem sempre é uma ladeira coberta de grama que se desce às cambalhotas. Quase nunca. Às vezes é o aclive de pedras soltas. Lá em cima a paisagem talvez seja bonita. Mas siga como se paisagem não houvesse.
É preciso que essa história seja cheia de pequenas histórias. E, em cada uma delas, necessária é a insistência. Cada vez mais acredito que desistir é coisa de covardes, não dos meramente fracos. Como somos covardes, os humanos. Os humanos que não ousam e encobrem a covardia sob a máscara de uma bravura, que na verdade é teimosia, orgulho e apego aos próprios traumas. Fortes e gelatinosos somos.
Quero amar você com dor e prazer. Um prazer tão grande que até dói. Uma dor tão grande que é viva. Um cacto nas tripas.
Ensine-me, sem saber, seu silêncio e seu resguardo. Silêncio é bom, principalmente depois de espernear. Os contrastes são lindos.
Deixe eu ser feio, deixe eu ser melancólico, deixe eu chorar no filme, deixe eu ser assim, quase sempre sozinho. Pra que vez em quando você possa me ver bonito, satisfeito e, no espelho, acompanhado. Mas deixe eu chorar no filme. Todos os personagens são eu e ser muitos fere. Na tela, ando e desando.
Que eu seja não a tábua de salvação no meio do mar. Porém, mesmo você vendo a palavra perdição estampada em cada parte do meu corpo, você se agarre a mim, fincando as unhas, porque ainda assim, sabe que valerá a pena. Serei seu gosto e desgosto, as melhores e as piores lembranças. Exijo coragem.
Permita-me exigir coisas pois nunca quero exigir. Nem pedir. E se exijo e se peço e se rogo é algo acima do querer, é algo mais forte que eu, que me arranca as artérias pelo pescoço. Por favor, entenda que não tenho necessidades, mas às vezes tenho necessariedades incontroláveis. Torno-me, nessas horas, fraco e rochoso, seco e sem saber para onde rolar. E, se recusa essas coisas, são minhas artérias que recusa. Já não deu. Apaga-se tudo.
Vivo com muito pouco. Como pouco. Bebo pouco. Sem ser um roedor, estabeleço-me em pequenos espaços. Gostaria apenas de segundos de atenção e o espaço esquerdo ou direito na sua cama de casal. Nem precisa ser sempre. Não me mexo muito. Eventualmente, roubo a coberta.
Costumo perdoar punhaladas. Só tenho dificuldade com as dadas pelas costas, pois é difícil arrancar sozinho a lâmina ali cravada. Os braços não alcançam. Daí quase sempre essa mania de procurar o amparo de quem tenta me assassinar.
Gosto de mentir denunciando a própria mentira, como se a mentira - assim evidenciada - fosse mais perdoável. De qualquer forma, acreditar que a denúncia sim seja falsa é sempre um desejo de quem a declara e de quem a ouve. Acima de tudo, somos os únicos animais que têm esperança de que pequenas falsificações sejam verdadeiras. Por isso nos abaixamos para tomar o dinheiro, descaradamente forjado, no chão da praça. Somos biologia de brinquedo.
Quero te amar, por isso, sem esperança alguma. Quero que seja minha danação, o demônio em minha carne, a pobreza e as feridas de Jó. Se eu conseguir isso, tudo o que me der será bom.
Poderei até mesmo partir. Sem que partir, para mim ou para você, seja novamente uma dor.
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