quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Cracatoa Simplesmente Sumiu

A Gillette fez o caminho inverso de Deus
Posted: 10 Sep 2008 07:39 AM CDT
Todas as marcas de produtos ambicionam tornar-se sinônimo do produto genérico.
Gillette, por exemplo, tornou-se sinônimo de lâmina de barbear, que muitos desde então nomeiam gilete. Nem a Coca-cola conseguiu fazer isso em relação aos refrigerantes.
Não recordo se existe algum caso inverso no comércio: uma empresa que tenta registrar o nome do produto genérico. O mais próximo que se chega disso é a marca Maizena em relação à maisena ou amido de milho.
No entanto, ao ler esse artigo sobre Como Escrever Deus em Sânscrito, concluí que o deus judaico-cristão (Jeová, Javé, Yahweh) foi o único que teve as manhas de se apropriar de nome genérico: Deus, com inicial maiúscula e tudo.
É como se a Gillette tivesse mudado seu nome para Lâmina de Barbear.
É quase uma violência contra quem prefere outras marcas ou prefere nenhuma. É como dizer que as outras lâminas não são exatamente lâminas, que cortam menos ou que não se barbear, afinal, é uma infâmia.
E, vendo esta tabela, entendemos que há pouca diferença entre os que se barbeiam e os que usam Lâmina de Barbear
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A Gillette fez o caminho inverso de Deus

Comida
Posted: 10 Sep 2008 06:02 AM CDT
Quando me perguntam sobre minha relação com a comida a primeira coisa de que me lembro sou eu a atravessar o quintal para chegar a casa dos meus avós, cedinho ainda, lá pelas sete horas. Às vezes mais cedo.
Ali eu me sentava à mesa, na cadeira que dá para uma janela de onde se podia ver um pé de caqui - com caquis que sempre amarraram a boca -, e observava minha avó a preparar um omelete, feito apenas com um ovo e sal, colocado desse jeito mesmo, simples, dentro do pão. A seguir, ela me servia uma caneca de café. Uma caneca grande para uma criança.
Eu tomo café assim desde os quatro anos e quando vou a alguns estabelecimentos e vejo o que eles chamam de um café grande tenho vontade de dar risada.
Eu sempre me deliciei com esse quebra-jejum.
Lá pelos oito anos comecei a sentir umas dores estranhas do lado direito. Meus pais concluíram que devia ser resultado da dieta matutina a base de ovos. Meu fígado devia estar atacado. Minha avó, então, substituiu os ovos por torradas que ela fazia a partir do pão que meu avô costumava trazer.Não era pão francês, não era pão d’água, não era broa, era outro pão que não sei dizer qual, redondinho e que não tinha o sabor dos melhores. Colocava-o seco na frigideira até que ele ficasse tostado e só então passava a manteiga. A faca passando na superfície seca fazia um crec-crec. Eu adorava quando meu avô comprava manteiga Aviação, aquela da latinha, mas com margarina também ficava bom. Cada pão sempre rendia umas cinco ou seis fatias longitudinais com as quais eu me encantava.
Meu fígado, ou seja lá o que fosse, parou de doer.
Por isso, passaram a intercalar as torradas e os omeletes. Por mim, tudo bem, desde que eles fossem acompanhados da grande caneca de café.
Tenho a vaga lembrança de minha primeira caneca. Mas como é muito vaga, não consigo descrevê-la. A caneca seguinte era bem grande, pois eu já era um rapaz. Branca, com uma listra em verde na borda, e o símbolo do exército brasileiro, pequeno, na lateral. Existe até hoje e está na casa de meus pais. Como ninguém da minha família serviu ao exército, não consigo imaginar como ela foi parar ali. Nunca encontrei granadas, fuzis ou munição de uso exclusivo. Embora eu sempre procurasse nas gavetas.
Eu não gostava do café da minha mãe e só tomava se não tivesse outra opção, embora ele não fosse ruim. Acho que foi minha vingança por não ter sido amamentado. Há! Eu sabia que ela ficava ressentida com isso.
Tenho bem clara a imagem de meu avô ao fogão a esquentar o virado de feijão feito no dia anterior. O virado já é feito com a sobra do feijão do almoço acrescentado de farinha de milho, portanto, ele já é um resto. Mas é requentado, na manhã seguinte, que ele demonstra todo o seu sabor. Certas palavras ficam na memória e a gente nem sabe o porquê.
- Que gostoso um viradinho de feijão bem engraxadinho pela manhã… - dizia meu avô naquela manhã enquanto remexia a panela de ferro preta.
E embora fosse bem engraxadinho o virado de feijão, lembro como ele era soltinho e não essa maçaroca de feijão e farinha que eu vejo as pessoas fazerem hoje em dia.
Virado de feijão pela manhã, outra delícia. Com a grande caneca de café.
Depois, eu e ele saíamos pelo bairro para comprar as coisas para o dia. Comprávamos pão em uma mercearia, óleo em outra, frutas em outra, algumas coisas no supermercado - que comparado com os de hoje era uma mercearia -, iogurte em outra. Todo dia. Eu achava realmente que andar muito para comprar comida fazia parte da vida. Ele sempre, ao final, me dava um daqueles guarda-chuvas de chocolate ou algum outro doce. Era recompensador, afinal, andar tanto. Não lembro de nossas conversas nesses trajetos mas acredito que ele me contava sobre sua vida. Devo ter aprendido alguma coisa. Tento me imaginar caminhando ao lado dele, como se estivesse observando a dupla, um muito novo e o outro muito velho.
Tínhamos três pereiras no quintal. Hoje elas não dão mais frutos. Ficaram velhas ou cansaram. Os galhos, antes, vergavam e não sabíamos o que fazer com tantas pêras. Eu lembro de tê-las comido cruas, juntadas do chão, colhidas, cozidas, líquidas e, acho, até fritas numa ocasião. Certa vez, uma caiu na minha cabeça. Não a comi.
Havia a amoreira que me fazia subir no telhado para comer as suas amoras e que me pintavam a língua de roxo. Nunca caí do telhado nem quebrei a cabeça e creio ter comido tantas amoras quanto quis. Não achei nada bom quando cortaram a árvore com a desculpa de que os frutos caídos faziam muita sujeira. Sujeira que às vezes ia parar no chão de casa. Mas nada justifica o corte daquela árvore.
A figueira dava frutos mais raramente e em menor quantidade, mas, quando dava, minha avó me trazia os figos partidos ao meio e já descascados, cobertos com açúcar.
Para o limoeiro nunca dei tanta importância. Mas sei hoje que fazer o suco com o limão que se colhe na hora do almoço nos fundos de casa é muito, muito, muito melhor que coca-cola. Aliás, quanta merda as pessoas andam bebendo hoje em dia.
Esses dias me perguntaram qual a minha comida preferida. Eu sempre fico na dúvida nessas horas, não sei se porque hoje eu goste de comer tantas coisas e com tamanho apetite ou se, talvez, nem faça tanta questão.
Porém, pensando bem, a melhor resposta seria dizer que eu já comi todas as minhas comidas preferidas. Não sobrou nem um pedacinho pra depois.
E, ao mesmo tempo, continuo a comê-las. Acompanhadas de uma grande caneca de café. Que delícia.
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