Diariamente, o planeta recebe 200.000 bocas para alimentar. Até 2050, a população mundial deverá atingir 9,2 bilhões de habitantes ante os atuais 6,7 bilhões. A resposta mais comum para enfrentar este desafio é dizer que será preciso aumentar a produção mundial de alimentos em 50% até lá. A reportagem é de Laurence Caramel, Le Monde, 19-02-2009. A tradução é do Cepat.
Mas não é isso que o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) defende em seu relatório dedicado à crise alimentar, publicado nesta terça-feira, 17 de fevereiro, por ocasião de sua reunião anual em Nairóbi. Para sair da cilada das necessidades alimentares crescentes, a organização privilegia a reciclagem das milhões de toneladas de alimentos hoje perdidos ou desperdiçados, e afirma que uma melhor eficácia só da cadeia produtiva alimentar permitiria alimentar o aumento da população esperada para 2050. “Este caminho foi até agora muito pouco explorado quando teria, além disso, a vantagem de reduzir a pressão sobre as terras férteis e limitar o desmatamento”, lamenta o PNUMA.
Concorrência pelas terras férteis
O relatório cita em lufadas de exemplos que, mesmo que não sejam todos novos, têm a vantagem de ilustrar bem a fragilidade de muitos agricultores de países do Sul, expostos às pragas, aos precários meios de armazenamento, à falta de transporte… mas também ao desperdício de nossas sociedades da abundância. No Reino Unido, um terço da alimentação comprada não é consumida, e nos Estados Unidos as perdas observadas em nível dos diferentes sistemas de distribuição são calculadas em aproximadamente 100 bilhões de dólares por ano. A título de comparação, as necessidades do Programa Alimentar Mundial, para socorrer as populações que sofrem com a fome, se elevaram para 3,5 bilhões de dólares em 2008.
No total, perto da metade da produção alimentar mundial é hoje perdida, rejeitada porque não corresponde às normas de mercado ou desperdiçada na hora de consumir. O PNUMA destaca ainda que 30 milhões de toneladas de peixe são jogados no mar anualmente. Volumes que bastariam, segundo a organização, para garantir a metade das necessidades suplementares de peixe até 2050 para manter o atual nível de consumo de peixe por habitante.
O PNUMA propõe, por outro lado, que esses “dejetos” sirvam para alimentar o gado, para evitar que uma parte crescente da produção mundial de cereais seja destinada à alimentação animal. Um terço dos cereais é hoje destinado ao consumo animal e em 2050 serão 50%, se persistirem as atuais tendências. Isso poderá ter consequências graves sobre o abastecimento das populações, lembra a organização, cujo aporte calórico diário é altamente dependente dos cereais.
Mas o relatório não pára por aí. Ele sugere também que a reciclagem dos dejetos seja direcionada para a produção de agrocombustíveis para limitar, também aqui, a concorrência pela exploração de terras que está na origem da explosão dos preços e da crise alimentar.
(Ecodebate, 23/02/2009) publicado pelo IHU On-line, 21/02/2009 [IHU On-line é publicado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
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